No dia 30 de novembro de 1955, eu fiz quatro anos e como toda criança, a minha felicidade foi um bolo de aniversário, todo branco, de glacê com bolinhas pratas. E não era daquelas miudinhas não. Foram bolinhas prata das grandes. Os meus olhos faiscaram de felicidade e até hoje têm a cor do céu, com uma mistura de felicidade, acho que por este motivo.
Eu não lembro de outra coisa, nem de ter tido um outro dia tão feliz (com aquela visão infantil de felicidade). Eu não lembro de pessoas, nem de presentes, lembro que minha mãe segurou um dos meus dedos para mostrar somente quatro com os outros à minha avó que chegou e pergunto quantos anos eu fazia.
São poucas as lembranças que eu tenho de quando era criança, mas esta me transformou em um ser eternamente feliz. Não me importaram mais os dias infelizes que eu tive, mas este dia me transformou em um ser eternamente feliz. Não importam mais os dias infelizes que eu possa ter, nem os momentos de privações e fome, mas aquele dia teve uma dose maciça de felicidade que foi capaz de alimentar todos os outros dias infelizes que eu tive pela frente até hoje.
Se hoje eu entendo meus filhos e netos (eles pensam que a gente não os entende) são pelas lembranças do ser que eu fui e cada momento de felicidade deles eu tento duplicar para que sobre para o resto de suas vidas.
Infelizmente a relação pais e filhos desde os primórdios sempre foram conturbadas. Quando eu percebo o desamor deles comigo, entendo que eu também não soube amar meus pais tão intensamente como mereciam e os perdoo e me perdoo por tudo o que fiz, pois não adiante alimentar estes sentimentos no nosso coração...
Eu penso que todas as crianças merecem ter seu bolo de glacê com bolinhas, como eu tive.
Que todas as crianças merecem por vezes ter comida para comer, roupas para vestir e até algum brinquedo, por mais simples que sejam, para que sejam pelo menos um dia na vida feliz e quem sabe daqui há cinquenta anos possam lembrar deste dia, mesmo numa foto amarelada da memória, ou guardado dentro de sua alma, como se fosse um porta-retratos, para poder lembrar dos dias felizes, e poder dizer eu fui feliz, eu fui amado. Existe uma razão para eu viver. E talvez uma simples lembrança possa ser um alento para todos os outros dias não muito felizes que temos...
Mário Feijó
20.01.10
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