quarta-feira, 23 de outubro de 2019

PRESENTE E PASSADO SE MISTURAM


PRESENTE E PASSADO SE MISTURAM
Ontem eu viajei! Fui à casa de vovó. Levei meu filho Roberto Nolasco que está prestes a completar cinco anos. A felicidade era mais minha do que dele porque eu me reportei ao tempo de criança quando toda a família se reunia na casa de vó Angelina.
No caminho com as janelas do carro abertas, sentindo o vento batendo no rosto, tinha nas narinas o cheiro do campo, por onde passávamos. Era cheiro de eucalipto misturado ao cheiro de flores, plantadas na região – lavanda. Incrível o perfume! Lembravam-me vovó Angelina, mesmo antes de poder abraçá-la, eu já sentia o cheiro de felicidade que arrepiava minha pele. Voltei ao meu tempo de criança.
As estradas empoeiradas do interior traziam à minha lembrança o frescor da viagem atual misturada ao encanto de encontrar primos, na infância.
Adoro animais domésticos e vovó tinha no quintal galinhas, patos e marrecos. A primeira coisa que perguntei:
- Tem ovos de pata?
Ela me mostrou uma cesta com todo tipo de ovos. Peguei três e já os coloquei para cozinhar. Adoro ovos de pata cozidos. Sinto água na boca só de pensar enquanto os ovos cozinham. Em cima do fogão à lenha havia um bule de barro com café fresco. O cheiro invadia o ambiente. Não resisti e tomei uma xícara.
Na rua eu ouvia Peri a latir. Os patos e as galinhas disputavam espaço para ganhar atenção de Roberto que lhes atirava milho. Era uma festa dos bichos e alegria de meu filho atirando milho para os bichos, ele um ser urbano encantado com a vida rural.
Vovó era só alegria. Vivia solitária no interior e dizia que jamais iria morar num apto. Era ajudada por um caseiro, tipo faz tudo e sua esposa que ajudava vovó com os afazeres domésticos.
No fogão já havia uma carne sendo assada numa panela de ferro, enquanto o feijão cozinhava borbulhando noutra. O arroz estava num canto já totalmente cozido. Na mesa já estava exposta uma salada mista que reunia frutas, legumes e verduras que enchiam os olhos.
Sai para o quintal e comi uma goiaba vermelha e uma bergamota. Adoro frutas colhidas no pé. Roberto veio correndo e pediu:
- Papai, descasca uma pra mim?
Estava um dia agradável, ensolarado, porém fresco. Fiquei ali pensando no passado.
De repente Maria nos chama dizendo que o almoço está pronto. Era tudo tão encantador quanto o ato de estar perto de vovó que sempre me encantava.
Foi assim que passei mais um domingo agradável e reconfortante que só a vida do interior é capaz de nos proporcionar.
De repente vovó senta à mesa e me olha séria perguntando:
- Quem é você?

Mário R. Feijó
24.10.19     

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

BATE PAPO




BATE PAPO

Eu adoro conversar com árvores
Elas são silenciosas, acolhedoras
Nada dizem
Só ouvem nossos lamentos

Lembro do dia em que meu filho
Foi atropelado e morreu
Um flamboyant me acolheu
Secou todas as minhas lágrimas

Vez ou outra ainda nos dão frutos
Embaixo de uma sombra fresca
Eu já me protegi da chuva outro dia
Hoje dizem que atraem raios

Atraem raios porque estão só
Quando eu era criança
Sempre havia uma floresta por perto
Eu brincava de esconde-esconde, e agora?

Mário Feijó
18.10.2019  

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

DESVIVEDOR DE MIM




DESVIVEDOR DE MIM

Eu vivo a costurar minh’alma
É que já morri tantas vezes
A vida me quer professor e aprendiz
Eu continuo a renascer todas as manhãs
E a morrer todas as noites
Em braços que me dão amor...

E descosturo a minh’alma
Para descansar os ossos
A maioria muito quebrados
Osteoporizados desde os tempos que envelheci...

E quando o cão me latiu pela primeira vez
Rasgando minha carne
Seguindo pela vida renasço
Depois de um desviver...

Agora costuro minhas carnes
Com beijos de amor
Costuro amores com dores
Do renascer e do morrer, e sigo
Vestindo vidas, nem todas minhas
Algumas encontrei jogadas
Pelas sarjetas do mundo
Daqueles que sem amor
Pela vida se foram
Sem nunca aprender
A viver e desviver...

Mário Feijó
18.04.12

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

AS DORES QUE PALPITAM NO PEITO





AS DORES QUE PALPITAM NO PEITO


A dor que nos aflige é tão nossa que por mais que você grite ninguém a sente. Podem até percebê-la, mas ninguém a sente.
Todos temos dificuldades e dores particulares é melhor não contá-las porque por mais que pareçam se importar, ninguém sofre por nossas dores.
E quanto mais idade ganhamos mais carentes ficamos, não adianta gemer ou gritar para ganhar mais amor.
No entanto, sofrem calados os viúvos; sofrem calados os solitários; os carentes de amor; os abandonados; os doentes nos hospitais; as meninas de rua; os que sofrem por suas escolhas; os rejeitados; as mães que sozinhas criam seus filhos; as mães que por amor têm que entregá-los a outros porque não podem ou não têm condições de criá-los.
Assim, as dores que palpitam no peito, viram choram silencioso e aprendemos a viver engolindo soluços.


Mário Feijó
07.09.19

quinta-feira, 3 de outubro de 2019

TEMPOS E TEMPO

Acrílico sobre tela... Mário Feijó

Reciclagem de garrafas... Mário Feijó
TEMPOS E TEMPO

Há tempos de amor
E tempo para refletir
Há tempos de dor
E tempo pra descansar
           
Há tempos de luz
Tempo de sol
E apenas tempo de luar

Há tempos em que eu te quero
E tempos de solidão
Há tempo em que estamos juntos
E outros em que tu vais embora

Há tempos para escrever
Outros apenas para ler
Há tempo em que eu uso as cores
E outros apenas para que eu possa admirar

Mário R. Feijó
03.09.19