terça-feira, 23 de maio de 2017

ENTRE O CHEIRO DE CAFÉ E O DE MARESIA




ENTRE O CHEIRO DE CAFÉ E O DE MARESIA

Sempre morei rodeado de mar. Eu mesmo já me senti uma ilha. Afinal de contas Florianópolis, cidade em que nasci, é uma ilha e eu morava no continente. Quando criança pensava que o resto do mundo era todo igual.
Pelas manhã ouvia o apito dos navios chegando na “Ponta do Leal”, onde havia o que chamávamos de “latões” da PETROBRAS, para descarregar óleo, gasolina, querosene e gás, derivados de petróleo.
Eu acordava todos os dias para ir pra aula com o cheiro do café fresco (que meu pai fazia) e o da maresia. Afinal eu morava a pouco mais de quinhentos metros do mar.
Cresci neste ambiente simples e gostoso. Sai pela primeira vez de casa para uma viagem ao Rio de Janeiro quando já tinha quase 22 anos. Fiquei encantado com aquela metrópole. Era tudo grandioso, movimentado, mas a geografia era muito parecida com a da minha terra. Chacoalhei durante 22 horas num ônibus convencional da “Autoviação Penha”. Que chic eu me senti.
Eu fui visitar minha tia Lourdes que morava há muito tempo no Rio de Janeiro. Sempre falou-se naquela cidade como algo maravilhoso. Até as músicas cantavam seus encantos. Não tínhamos televisão. O máximo que tínhamos eram os cartões postais. Uma beleza indescritível para um sonhador que vivia catando revistas e jornais velhos na rua (nunca inteiros, sempre uma única folha rasgada, mesmo assim eu lia).
A geografia das duas cidades, Rio de Janeiro e Florianópolis, eram muito parecidas: morros e muito mar no pé das montanhas. Para todos os lados que a gente olha é isto o que vemos. Além do mais o Rio de Janeiro também tem a sua ilha de Niterói bem na frente da cidade. As praias são tão belas, numa e noutra.
Meu primeiro choque com a geografia aconteceu quando viajei para o nordeste. Faltavam lá os morros para encantar a paisagem. Nunca vira o mar tão infinitamente grande e assustador, foi assim em Natal e Fortaleza.
Mais tarde, depois dos cinquenta anos, comecei a me aventurar pelos países da Bacia do Prata: Uruguai e Argentina. Lá também o horizonte é infinito e o mar grandioso. Só que o Oceano é o Pacífico e não o nosso Oceano Atlântico.
Neste momento, eu me recolho em minhas reflexões, percebendo o quão pequeno sou diante da grandeza e da força do mar ouvindo suas ondas batendo na frente da casa de minha amiga Maria da Graça. Aprendi a viver no litoral do Rio Grande do Sul sem reclamar das montanhas que faltam atrás do mar.
Volto à realidade ouvindo o chiado da chaleira fervendo onde minha amiga passa um café cheiroso que ameniza o gostoso cheiro de maresia, sem o qual não sei viver.
Minha memória sempre foi acentuada quando ouço ou vejo, e, sem ouvir o mar ou sentir o cheiro de café eu prefiro que “me tirem os tubos”, como dizia um personagem de Jô Soares quando acordava de um coma e se deparava com uma realidade estranha a que estava acostumado.

Mário Feijó
23.05.17


(Texto produzido na Oficina Literária Mário Feijó, nesta data) 

segunda-feira, 22 de maio de 2017

O MOTIVO DA TRISTEZA DE CAROL (segundo capítulo)



O MOTIVO DA TRISTEZA DE CAROL (segundo capítulo)

Jorge é um homem de 38 anos, 1,90m de altura, atleta, pesando 90 quilos, formado em administração de empresas e trabalha na Universidade Federal de Santa Catarina como professor de administração. É mestre em Recursos Humanos e professor adjunto no departamento de administração, do Centro Socioeconômico.
 Apaixonou-se por Carol quando ela quis fazer mestrado na área de Recursos Humanos e ele foi seu professor. Estão juntos há dois anos e meio. Para ele nunca pesou o fato de ela ser mais velha que ele. Nunca outros perceberam isto física ou emocionalmente.
A relação entre os dois sempre foi ótima. Eram sexualmente liberais, nunca moraram junto. Não havia ciúmes e cobranças entre eles e se encontravam duas ou três vezes por semana.
Ultimamente Carol vinha tocando muito repetidamente neste assunto, no qual Jorge não queria discutir. Sempre soubera que ele não queria ter filhos e ela insistentemente falava em ter mais um.
Ela sempre dissera a Jorge que não queria mais filhos. Tivera dois filhos antes, fruto do seu primeiro amor quanto tinha 15 e 17 anos. Portanto já se preparava para ser avó a qualquer hora.
Pensara estar na menopausa e começou a sentir coisas estranhas em seu corpo e resolvera ir ao médico que confirmara uma gravidez de 13 semanas. No início foi um choque, mas ela era contra o aborto. Totalmente contra. Não fora precavida pelo fato de que sua menstruação muito irregular passara a ser distante acontecendo no último ano somente três vezes. Seu médico lhe dissera que estava entrando na menopausa. Aí relaxou no contraceptivo.
Por isto tocara no assunto com Jorge, porque tinha medo de ser direta, e começaram a discutir e pouco se verem. Ela não falara pra ninguém sobre a gravidez sabida há pouco mais de um mês e no dia sete de maio, na semana que antecedia o dia das mães, ela tinha viajado a trabalho e no hotel tropeçara e caíra numa escada. Foi parar num hospital, teve toda a assistência, porém seu bebê não resistira ao tombo da mãe. Três horas depois o médico lhe informara que o bebê não sobreviveu. Sofrera tudo sozinha. Primeiro porque não conseguira contar a Pedro, e se ele não sabia para quê iria contar. Só depois iria decidir o que fazer. Ficara hospitalizada por dois dias e depois fora embora. Ela estava em Blumenau e pedira para sua colega de trabalho Cléia vir buscá-la como motorista. No caminho lhe contaria tudo. Agora não fazia mais sentido esconder de ninguém. Não só seu corpo estava machucado. Sua alma estava dolorida. O médico lhe dera um atestado de três dias e na empresa tudo ficaria por conta do tombo.
Jorge aparecera e a tratara com carinho. Ela não lhe contou nada... Agora não fazia mais sentido, era o que lhe parecia. E por mágoa resolvera por um fim no relacionamento. Colocou a culpa de seu drama todo na sua intransigência e não conseguia perdoá-lo. Sofriam ambos, pois eram apaixonados. Mas ela pensou que era melhor assim. Sofria agora duas vezes. Por seu grande amor e por seu filho que não vingara.
Refletiu sobre sua vida, desde o primeiro amor que acabara durando apenas sete anos. Ambos eram imaturos, mas valera, pois fora um amor tranquilo. E agora que tinha um grande amor não conseguia a paz e a tranquilidade quando se casara com Alexandre, pai de seus dois filhos e que se tornara um grande amigo.
No dia das mães e aniversário da avó ela tinha bastantes motivos para tamanha tristeza. Não contara a ninguém, além de Cléia, decidiria depois o que fazer com o fato. Primeiro iria se curar daquela dor. Por isto logo depois de comer uma pequena porção de peixe frito com pirão e camarões ensopados, saiu à francesa, sem ser vista. Dentro do carro desmoronou em prantos e com medo pegou o celular e ligou para Jorge.


Mário Feijó  - Fim do segundo capítulo

SIMPLES ASSIM



SIMPLES ASSIM

Eu simplesmente me calo
Diante da beleza da flores
Da energia do mar
Da luz do sol e do brilho do luar

Eu silencio diante do poder de Deus
Do riso de uma criança 
Do olhar carente dos nossos velhos
E me encanto com o sopro dos ventos 

Com a frescura das matas
Com a vitalidade dos rios
Que saciam os seres vivos

Eu simplesmente me calo
Diante do teu corpo 
Que por vezes apenas me aquece
E sempre me oferece muito amor


Mário Feijó
20.05.17

quarta-feira, 10 de maio de 2017

MINHA RESSURREIÇÃO





MINHA RESSURREIÇÃO

Havia sol nos meus dias
Mesmo quando neles chovia
Eu via a luz de felicidade
Nos verdes olhos de minha mãe

Ela era campo perfumado
E eu sentia o cheiro de alfazema
Que ela todos os dias exalava
Como se fossem tardes primaveris

Hoje ela é apenas brisa fresca
Nas lembranças que me sobraram
Porém ela está tão presente
Quanto quarenta anos atrás

Eu apenas me descobria homem
No dia em que me disseram:
“Tua mãe faleceu”
Só agora eu descubro que ainda estamos vivos

Mário Feijó

09.05.17

A TRISTEZA DE CAROL (conto) 1º. CAPITULO




A TRISTEZA DE CAROL (conto)

1º. CAPITULO

                Carol era uma mulher que por onde passava sempre chamava a atenção. Era bonita, dentes brancos, sorriso largo e arrasador, cabelos negros longos, porém seu perfume a precedia, anunciando sua chegada muito antes de sua presença. E, ao adentrar em qualquer ambiente o som da sua voz abafavam qualquer música ambiente.
Ex professora, acostumara-se a falar alto e ela perdera o bom senso, embora muitos já a tenham prevenido quanto a isto.
Toda a família havia combinado de se encontrar, em um restaurante, em Florianópolis, à beira da Lagoa da Conceição. Viria gente de todo lado.
O cheiro de maresia com certeza iria ameninar o perfume forte e adocicado daquela mulher. A família pensara que isto amenizaria seu protagonismo escolhendo um local público, ao ar livre, onde a brisa suave (geralmente causando frisson na pele) e o cheiro de frutos do mar sendo preparados abriria o apetite em todos naquele dia das mães. Ficara para trás a comidinha caseira comum na casa de vovó, todos os domingos, onde a maioria ia sempre, mas também ninguém precisaria lavar a louça daquela tropa toda. Com certeza sentirei falta do cheirinho do café Amélia que vovó agora usava, substituindo seu café produzido no quintal por tanto tempo, e que agora era substituído por um produzido na cidade.
Sobrinhos, netos, irmãos, primos, todos se fizeram presentes. Se faltou alguém eu não saberia dizer quem, pois havia ali quase cem pessoas.
Juntamos duas ocasiões: o dia das mães, no segundo domingo de maio e o aniversário de 100 anos de vovó que seria dia 17.
Carol veio silenciosa. Estava comedida naquele dia. Eu diria que tensa. Pouco falou. Sentou-se num canto, depois de ter cumprimentado vovó e alguns irmãos. Pouco comeu. Pouco falou. Nada bebeu e em determinado momento eu percebi uma lágrima que ela secara rapidamente. Seu atual companheiro não estava presente, porém aquele dia e hora não era o momento certo para uma investigação ou perguntas. Naquele dia não era Carol a protagonista, mas muitos ficaram de ti-ti-ti numa mesa ou outra. Ela comera rapidamente e disfarçadamente se afastou do restaurante. Soubemos mais tarde que havia “saído à francesa”.
A curiosidade aumentara entre os presente, e, todos tiveram que ficar quietos e esperar pela segunda-feira ou por notícias que seriam, certamente publicadas no Facebook. Sua vida sempre fora um livro aberto.
Certamente aquele era um dia feliz para a maioria, mas não foi o melhor dia na vida de Carol...


Mário Feijó
09.05.17



terça-feira, 9 de maio de 2017

O RETRATO (MÃE)


O RETRATO

Os raios de sol
Entram pela janela
E batem na moldura
Da foto sobre a mesa

Reproduz uma linda mulher
Com uma criança ao seio
O cabelo loiro resplandece luz

Os olhos verdes lembram o mar
Tudo remete à harmonia,
À beleza da criação
À vida e o seu desenrolar

Nada parece destoar
Em um quadro amoroso
Rembrandt poderia tê-lo pintado
Com seus pincéis mágicos

Porém nenhuma tinta
Revelaria a magia da Maternidade
Em toda a sua grandeza

Marlene Nahas
09.05.17
(Trabalho desenvolvido na Oficina Literária de Mário Feijó, nesta data)






http://www.recantodasletras.com.br/poesiascomemorativas/5994478

segunda-feira, 8 de maio de 2017

FLORES PARA IEMANJÁ




FLORES PARA IEMANJÁ

Ah! Eu quero olhar o horizonte
E me debruçar nas janelas
Imaginando como será
Lá distante, do outro lado do mundo

Virar a página de livro
E num piscar de olhos
Ver a lua cheia tocar seus lábios
Para beijar as ondas do mar... invejosa!

Olhava-nos à beira mar
Cheirando maresia, degustando ostras,
Siris e camarões enquanto no fundo
Um iate levava turistas aos mares do sul

Em nossos olhos o êxtase do amor
A lua apenas refletia o que sentiam os cidadãos
Da capital do estado que procuravam um descanso
E no feriado jogavam flores pra Iemanjá...

Mário Feijó

07.05.17

domingo, 7 de maio de 2017

RATOLÂNDIA BRASIL




RATOLÂNDIA BRASIL

Há muitos ratos
Ratinhos sem-vergonhas
Que passam por ratoeiras
Que não perdem seus rabos
Porém algumas vezes perdem
Somente os dedinhos

Há ratos com nome de gente:
Luiz, Dirceu, Antônio, Sérgio
Seria o ponto(pt) final deles?
Porém rato é rato, mesmo preso,
E se tiverem oportunidades irão roubar novamente

Mas o povo é o culpado quando faz escolhas
Há quem acredite que sejam “pais dos pobres”
Porem o que eles querem é enriquecer aos seus
E se manter no poder
Um poder que lhes dê poder de decisão
De administrar os recursos da nação
A seu bel prazer e interesse

E os ratos de estimação que aí estão
Sempre farão de tudo pelos seus, porque
Se classificam como seres honestos
Os mais honestos do mundo
Talvez por isto tenham perdido seus dedos
Colocando a mão em cumbuca errada

E depois de descobertos continuam roendo
Mais de 65 bilhões de dólares de uma empreiteira
Colocados à sua disposição.

Socorro! Socorro! Como tem gente cega
Como tem rato político rico
Gente até hoje nunca punida
Que se socorrem apelando ao santo protetor
(São Paulo Maluf)

E têm suas orações sempre atendidas, graças a Deus,
Seus catadores de bosta de elefante limpam tudo
Recolhendo tudo embaixo do tapete
Basta dizer “não sei de nada” e “não é meu”
Enquanto o país vai à bancarrota

Está na hora de construirmos mais cadeias
Em forma de ratoeira
Já que este é um país
Onde os ratos tanto prosperam...


Mário Feijó - 07.05.17

sábado, 6 de maio de 2017

MEMÓRIAS AFETIVAS



MEMÓRIAS AFETIVAS

Meus dias eram assim:

pela manhã


o cheiro do café moído na hora
em um pilão de madeira
que vovó torrava em seu fogão à lenha
era passado em um coador de pano
em um bule de barro (o café nunca queimava)
estava sempre quente e fresco
ao meio dia

Felicidade pegava o feijão que cozinhara
(era um caldo grosso e negro)
e fazia um pirão com ele
alguns chamam de feijão mexido
em cima espalhava uma gema de ovo crua
que o calor cozinhava
e deixava um sabor sem igual
se havia carne seca ou linguiça
(que eu às vezes comprava 100g)
eu nem lembro, até porque
só isto bastava para matar
a minha fome de ter Felicidade por perto
à noite

bem, à noite era inevitável
pulgas sob as cobertas
provavelmente heranças de Peri
um cão branco e velho
que eu nunca vira latir
talvez seja por isto
que hoje mesmo sem as pulgas
eu fique rolando na cama sem dormir
pensando em como fui feliz
quando morei com "Felicidade"
minha querida avó materna.


03.05.17

sobre o AMOR





Quando amamos alguém começamos tirando toda a roupa e aos poucos desnudamos toda a alma. Mário Feijó

SONHOS ADOLESCENTES (LASCÍVIA)




SONHOS ADOLESCENTES (LASCÍVIA)


ela era escorregadia
parecia não ter corpo
porém todas as noites
enfiava-se sob minhas cobertas
e mordia meu corpo
sugava meu sangue
mesmo em partes mais intimas
algumas vezes sem me deixar dormir
sonhava com ela: mulher
provocando em mim tesão
havia em minha adolescente excesso de tesão
hormônios à flor da pele
compreensível,
diriam alguns
libidinosos,
diriam outros
ao acordar eu percebia
que tudo aquilo era apenas um sonho
e colocava as cobertas ao sol
para catar as pulgas que me mordiam


Mário Feijó
04.05.17