quarta-feira, 4 de abril de 2012

O SOL DO QUINTAL DA TIA LOURDES





Fazia uma tarde brilhante. Dessas que parece ter Tia Lourdes passado saponáceo no sol, de tão reluzente que ele se fazia.

Tia Lourdes era dessas mulheres que mesmo com oitenta e tantos anos se achava na obrigação de tudo limpar, e de tudo arear... talvez até o sol ela areasse, pensava eu.

Tia Lourdes era uma daquelas idosas que mesmo alquebrada pela idade sempre me parecia uma adolescente. Seus cabelos eram tão brancos que de tão brancos eu tinha a impressão de que ela lavava com sabão em pó para clareá-los, como fazia com as roupas. E os seus olhos então. Os seus olhos eram tão azuis, como os olhos do céu naquela tarde. Não havia uma nuvem nele. Ela era pra mim o protótipo de todos os seres que já passaram pela minha família, desde os meus pais aos meus avós, maternos e paternos, e meus irmãos e tios.

Tia Lordes era uma mulher linda, desde a juventude. Eu comparava sua beleza a beleza da Virgem Maria que ela tanto venerava na igreja que ia.

Eu lembro que na casa de tia Lourdes haviam chinelos para andar dentro de casa, chinelos para andar na área cimentada e com pisos e chinelos para andar no quintal. E o quintal era uma beleza. Lá haviam muitas frutas e flores e as flores que eu mais gostava no quintal de Tia Lourdes eram os lírios e os copos-de-leite. Mas as orquídeas também causavam inveja aos transeuntes. E naquele quintal “o que se plantava dava”.

Há alguns anos eu chupei bergamotas e resolvi jogar as sementes num canto, agora quando vou visitá-la no mês de maio há sempre bergamotas (tangerina ou mexerica, como chamam alguns).

Algumas vezes eu penso que por ela limpar tudo, até o céu do quintal da Tia Lourdes é mais limpos e quiçá seja por isto que os copos-de-leite e os lírios do seu quintal sejam tão brancos.

Agora que minhas lembranças do passado brotaram como se fossem a nascente de um rio. Eu clareio minha mente com o sol do quintal da Tia Lourdes.



Mário Feijó

03.04.12

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