segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

UMA CRÔNICA PARA MIA COUTO



UMA CRÔNICA AO MENOS

Mia Couto é um escritor moçambicano pelo qual eu tenho a maior admiração e respeito. Uma pessoa que coloca em sua prosa, metáforas como estas, tem a minha admiração.
Vejamos algumas delas grifadas do Livro Terra Sonâmbula:
“A guerra é uma cobra que usa nossos próprios dentes para morder”;
“Aos poucos eu sentia nossa família quebrar-se como um pote lançado ao chão”...
“Em vez de esperarmos a estrada nós fazemos o nosso caminho”;
“Eu estava parado naquela mulher como os ferros preguiçosamente estavam cravados no banco de areia”...
“no convés do barco e na chuva eu estava molhado até dentro dos olhos”...
“insisti, porém o silêncio teimou mais que eu”...
“o melhor lugar para um ser vivo se esconder é no meio de um enterro”...
“nos colocávamos em gestos de afogados”...
“uma vida inteira não seria suficiente para contemplar aqueles olhos”...
“Cinzas. Se nos olhos dela dormitavam, em brasas se acenderam”...
“Toquei primeiro em seus dentes, depois senti sua saliva quente. Parecia que não era apenas um dedo, mas todo eu inteiro que penetrava numa caverna aquecida. Outro dedo caminhou nos interiores dela, nervoso de contente”.
“subi por um caminhonito tão estreito que se duas serpentes quisessem namorar, não iriam conseguir”...
“Ria criança! Rindo as alegrias acontecem”...
“Este gajo tem os dias descontados”...
“Filho, eu vivi num tempo em que o amor era coisa perigosa. Você vive num tempo em que o amor é coisa estúpida”...
“A velha durava mais que a sua validade”...
“Ela se deixa, dissolvida, sonâmbula, num fecha-te sésamo!”...
“As árvores se sujeitavam às mágoas da ventania, pois o vento nunca se levanta contente”...    
“Falemos baixinho que as paredes têm mais orelhas que elefantes”...

Isto é Terra Sonâmbula e aqui homens, feito Mia Couto, tornam-se deuses para criar sonhos e nos levar ao delírio.
Disse Martha Medeiros, em uma crônica, que alguns escritores nestas horas vestem-se de deuses. Eu partilho desta opinião. Esta metáfora não flerta com a blasfêmia, ela nos faz pensar que podemos ir além de nós mesmos e do que queremos.
Poesia é um exercício diário de olhar a vida com arte, capaz de transformar mundos monocromáticos em planetas coloridos e mais alegres.
A felicidade pode não pertencer a este mundo, conforme afirmou Cristo, mas nós não estamos impedidos de persegui-la. Nem tudo é perfeito, porém eu sou feliz.
Mia Couto diz que aprendeu muito com Guimarães Rosa e com outros escritores brasileiros e portugueses. Eu também e afirmo que mestres como: Mário Quintana, Carlos Drumond de Andrade, Cecília Meireles, Clarisse Lispector, Florbela Espanca, Érico Veríssimo, Machado de Assis, Manuel de Barros, Cora Coralina e tantos outros desconhecidos como minha avó, Felicidade, que mesmo analfabeta foi meu chão, minha base.
Hoje eu continuo aprendendo quando olho para os lados, com meus colegas, com meus alunos, com os trabalhadores que executam o seu trabalho com amor, com os animais quando olho no olho sinto seus amores. Aprendo que estou neste planeta aprendendo com tudo e com todos que interajo. A vida é assim: evolução. E evolução é uma bomba que de vez em quando explode gerando transformações.
Que cada um que me leia seja tocado e se descubra, que tenha uma nova visão de si mesmo e do mundo, mesmo que não aprendam a fazer poesia, a fazer um conto ou uma crônica mas que saibam quando é hora de mudar, de ser melhores para si mesmos, sem se preocupar muito com o que o outro pensa...

Mário Feijó
12.02.13

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