Eu nunca pensei que chegaria aos sessenta anos. No entanto
ao chegar lá eu acho tão pouco tudo o que e vi. Eu continuo sonhando, mas a
vida quer me obrigar a achar que sou velho. E as pessoas ao meu redor não
ajudam, elas também pensam que eu sou velho. Mas eu não sou. Existe dentro de
mim uma energia que me diz, esta história de velhice é para quem está doente,
do corpo ou da cabeça. Eu apesar dos percalços da vida, não me acredito velho,
nem doente.
Todos nós somos uma ilha. Eu acredito nisto, pois
dentro de nós só habita um ser: EU. Quando isto não acontece, deixamos de sermos
nós mesmos ou passamos a ser “perturbados” porque deixamos outras energias a
interferir na nossa. Nosso corpo é uma casa que nos foi doada, para habitarmos
enquanto vivermos. Então só depende de nós quem habitará este corpo, quem irá
frequentá-lo, e tudo o que colocamos para dentro de nós é responsabilidade
nossa, do alimento a drogas. São escolhas que fazemos a partir do nosso livre
arbítrio e devemos arcar com as consequências desta decisão.
Quando eu era criança pensava que pessoas com mais de
quarenta anos eram velhas. Como eu fui tolo, como as pessoas que pensam assim
são tolas. É exatamente a partir dos trinta-quarenta anos que nos tornamos mais
conscientes de nós mesmos. É a partir desta idade que ganhamos maturidade naquilo
que produzimos. É a partir desta idade que tudo o que fazemos tem mais
qualidade.
Eu só vejo um problema quando vamos ganhando idade: é
que vamos mais e mais sendo abandonados. Vamos conhecendo a solidão de si
mesmos. Mas é uma consequência natural, pois passamos uma vida inteira ao lado
de um monte de gente e algumas vezes esquecemo-nos de passar alguns momentos
conosco. Esta solidão é benéfica. Quem não consegue ficar bem consigo mesmo é
porque nunca foi boa companhia para os outros.
Minha vida foi construída para fazer de mim um ser
melhor. Portanto eu nunca procurei acumular coisas. As pernas algumas vezes
cansam então eu precisei ter um carro. O corpo se debilita ao relento, portanto
eu precisei ter uma casa. Não precisa ser minha, pode ser alugada ou de alguém,
mas eu preciso me abrigar. Por isto eu me ensinei a ser feliz. Eu me ensinei a
me contentar com pouco. Isto não quer dizer que eu não tenha lutado por mais,
por ter, por fazer. Lutei sim, mas isto nunca foi importante. Também tentei
ensinar isto aos meus, mas cada um aprende do seu modo.
Eu estou completando sessenta anos de vida. Alguns até
dizem que não aparento, mas não é isto o que importa. O que importa é o que eu
sinto, como me vejo diante da vida, como me coloco diante do universo, minha relação
com os demais seres que habitam este planeta. Minha relação com a natureza. Jamais
estive tão lúcido em relação a mim e em relação ao que eu represento neste
planeta. Isto não pode ser velhice, isto é sapiência, isto é vivência saudável,
isto é felicidade. Se os outros não me compreendem, se os outros não me
entendem isto não é culpa minha, é falta de maturidade do outro, mas este outro
também não tem culpa. Somos somente seres humanos em aprendizagem, somos
espíritos em evolução.
Erros no caminho todos cometeram: eu e os outros. Temos
é que nos perdoar uns aos outros. Temos é que perdoar a nós mesmos. Ser compreensivos
em relação aos outros, ser complacentes conosco.
Este é um momento de comemorar? É sim. Todos os dias
são momentos de comemorar: estamos vivos. Bem ou mal estamos vivos. Temos consciência
de nós. Então devemos comemorar e agradecer a todas as energias que nos
mantiveram vivos. Quem acredita em Deus agradeça a Ele pela sua existência. Quem
não acredita agradeça a qualquer coisa, agradeça aos seus pais por terem lhes
dado a vida, agradeça aos filhos que teve, agradeça à natureza por ter lhe dado
alimentos, por ter lhe dado água, ao sol por ter lhe dado luz e energia,
agradeça aos ventos, agradeça ao ar. Há muitas razões para se viver. Algumas delas
até desconhecemos, outras estão à nossa volta... Sempre nos sobram mãos e
braços estendidos em nossa direção. Exigir que estas mãos e estes braços sejam
dos filhos, dos irmãos, dos parentes é demais. Agradeça mesmo quando estas mãos
e estes braços forem de um enfermeiro num hospital ou de um desconhecido quando
você estiver no chão. Isto é saber viver. O resto não importa. Você está vivo. Você
é um vencedor.
Mário
Feijó (30.11.11)
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