Cap. II – Sequência de
erros e arrependimento
Havia anoitecido desde
que Alexandre saiu da praia. A hora agora já se aproximava das 9 horas da
noite.
Era uma noite escura. O
dia tinha se encerrado assim, visto que ainda chovia na cidade. Parecia a
cabeça de Alexandre quando percebia a enrascada em que se metia, complicando-o
cada vez mais.
Por que no dia do
acontecimento não foi direto à delegacia? Era o que perguntava a si mesmo.
Por que voltara ao
local do acidente (agora crime) e cortara a cabeça de Marina?
Por que levara a cabeça
para outro lugar?
Tudo isto lhe
atormentava agora. Pensava:
Agora sim eu cometi um
crime, quando antes tinha sido só um acidente. Ninguém mais vai acreditar em
mim se eu voltar e contar o que aconteceu.
Pensava “o destino nos
coloca por caminhos tortuosos, cheios de espinhos, momentos inexplicáveis.
Continuava pedalando. Olhava
mais para o pretume do asfalto do que para o céu nublado e foi num levantar de
olhos, quando já chegava à Costeira do Pirajubaé, que viu uma pequenina capela,
típica igreja açoriana, branca e amarela, no meio de muito verde. Parou e
sentiu vontade de lá entrar.
Alexandre largou a
bicicleta na frente da paróquia e enquanto subia os degraus da igrejinha ouvia
vozes que vinham do seu interior. Espiou. Tirou seu capacete e viu um padre ao
lado de uma senhora que com o véu na cabeça gesticulava e apontava para si.
Pé ante pé,
ajoelhou-se, precisava de um alento naquele turbilhão de pensamentos e culpas
por erros que não tinham mais como serem corrigidos. Lágrimas caem de seu
rosto...
O padre percebeu o
desespero do rapaz. Pede licença à beata e se dirige a ele dizendo:
- Venha meu filho.
Vamos até à sacristia, acho que você precisa conversar...
Depois de se confessar
Alexandre se sentia menos culpado. O que fizera com cadáver poderia até ser
monstruoso, mas foi em desespero e a pessoa já estava morta.
Voltou para o quarto da
pensão. Tinha a intenção de pegar suas coisas, devolver a bicicleta alugada e
voltar para sua casa.
Entretanto, nada seria
tão fácil como ele imaginara. Ao chegar na pensão para acertar suas contas
deparou-se com o Prof. Antônio, aquele mesmo que conversara na frente do mar.
Ele tinha um filho hospedado ali com a família, visto que sua casa no Pântano
do Sul era pequena e já estava cheia. Fora até o local buscá-los para jantar em
sua casa.
Bem, agora ele não
poderia mais sair apressadamente, teria que ter mais paciência, mas também nem
tinha comprado passagem para aquela noite. Se bem que passagem para Porto
Alegre, geralmente havia possibilidade, visto que havia vários ônibus saindo
desta capital para aquela.
O professor quando o
viu logo veio logo ao seu encontro, cumprimentando-o efusivamente e ele
disfarçou a impaciência e o desconforto daquele reencontro, porém o professor
puxa uma cadeira e faz menção de se sentar para uma conversa.
Alexandre então
perguntou:
- Onde o senhor
lecionava antes da aposentadoria? Quais matérias lecionava? Tinha muitos
alunos?
Na realidade ele não
queria resposta alguma, mas tentar disfarçar o desconforto que sentia. Desta
forma inventou outras perguntas sem esperar pelas respostas das que já tinha
feito.
O Professor Antonio
explicou que leciona Medicina Legal, na Faculdade de Medicina da PUC/Porto
Alegre, para turmas mistas, sempre com 40 a 50 alunos. Adorava lecionar e ver o
entusiasmo das garotas e rapazes, discutindo meandros de perícias e as
possíveis causas da morte. Continuou falando de suas experiências como docente,
em sua cidade, mas Alexandre já não prestava mais atenção à conversa, sendo
despertado do seu alheamento quando ouviu o professor lhe perguntar:
- Onde e como você
machucou tanto suas mãos?
Alexandre sem saber o
que responder disse:
- Sou
artesão/carpinteiro e sempre me machuco no trabalho, mas recentemente tive uma
briga. Alguém tentou roubar minha bicicleta. E deu o assunto por encerrado.
O professor que era
especialista na área, aposentado, sem ter o que fazer, ficou matutando sobre as
respostas. Não satisfeito pensou, depois pego o endereço deste rapaz na
recepção. Acho que vamos ter que conversar mais sobre este assunto futuramente.
Quando Marina chegou à
cidade, todos os homens a queriam. Tinha um jeito sedutor no olhar e seu modo
de caminhar enfeitiçava todos os homens. Ela fora para a ilha com um namorado,
Fábio, mas logo a relação terminou. Era estudante, na Universidade Federal e
sobrevivia como doceira, fizera um curso de culinária em Osório com uma
requintada doceira daquela cidade, chamada Silvania. Aprendera a colocar
sensualidade e prazer no sabor.
Pedro era um homem
tímido, solitário, talvez a profissão de pescador o induzira a viver bem assim.
Não tinha namorada. As mulheres não o achavam interessante e ele tentava não
chamar muito a atenção para si. Havia aprendido a ser assim e se escondia na
bebida que ora ou outra ingeria até quase cair.
E foi isto o que
aconteceu naquele inicio de noite, numa tarde chuvosa de abril.
Pedro fora uma das
vítimas daquelas maravilhas e ficara envolvido nas doçuras daquela paixão. Para
alimentar seus sonhos ele a seguia sempre que podia. Nunca havia visto uma
mulher tão sedutora e sem pudores. Estava enfeitiçado e a magia da ilha
contribuía para isto. Dizia-se que muitas bruxas eram atraídas para a ilha e
usavam as mais diversas artimanhas para terem os homens aos seus pés.
Naquela noite fatídica
ele a seguira tão logo ela saira do bar onde ele também bebia, ficara longe
espiando-a e viu quando ela encontrou Alexandre. Vira quando ela tentara
seduzi-lo e assistiu quando a história tomou outro rumo. Alexandre ficou
enfurecido com o assédio da mulher. Ele a empurrou e ela se desequilibrou e
caiu entre as pedras. Alexandre se foi. Pedro que viu tudo estava estarrecido.
Tremia tanto que não podia se mover de onde estava. O medo e a chuva o deixaram
sem ação. O corpo havia caído bem perto de onde estava. Quando o rapaz sumiu
foi até o local e vira que a mulher estava morta. Fugiu do local. Foi para sua
casa e já com o álcool fazendo efeito, deitou e dormiu.
Na manhã seguinte foi
ao quintal colher ervas para um chá. O aroma se espalhou pela casa, o tremor que
sentia foi passando, mas as lembranças não o deixavam. Teria sido aquilo um
sonho? Ligou o rádio e em todos os
jornais das emissoras que zapeava só ouvia:
Estava apavorado. Era
cúmplice de um crime.
O que iria fazer?
Pensou pobre e bêbado vão me acusar. Resolvera calar-se...
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Construção coletiva do
segundo capítulo com a colaboração de:
Heloisa Mascolo,
Marlene Nahas, Natir Lacerda e Silvânia Anderson
CAPÍTULO III
A SAGA CONTINUA
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