quarta-feira, 28 de junho de 2017

CARTA A UM AMOR PERDIDO




CARTA A UM AMOR PERDIDO

Osório, 13 de junho de 2017

Querida Maria de Fátima

                Eu lembro de ti, com 17 anos, sorriso frouxo, boca deliciosamente fresca, beijo de jabuticaba madura, uma adolescente linda e magricela, pela qual me apaixonei.
Houve uma vez em que eu te beijei (foram poucas as vezes) e achei que tinha estourado na minha boca uma jabuticaba madura, doce, fora muito doce aquele beijo. Foi algo tão inusitado que eu nunca esqueci. Eu era um rapaz que tinha feito recentemente 20 anos e tinha passado no vestibular. Bobo, inexperiente, magricelo e ridiculamente feio (era isto que eu pensava de mim).
Hoje eu penso que terias sido meu amor da vida inteira. A vida embaralhou as nossas vidas e eu te perdi por uma bobagem à toa eternamente. Nunca mais te vi. Nunca mais tive notícias tuas, mesmo tendo te procurando depois dos meus términos de casamentos, tanto depois do primeiro, quanto depois do segundo. Já haviam se passado trinta e cinco anos daquele beijo. Ninguém te conhecia no lugar onde antes moravas, nem souberam dar notícias sobre a família.
Hoje já deves ter um pouco mais de sessenta anos e eu sinto saudades do que nunca fomos. Sinto saudades de ti, como se fosse ontem. Penso: como será que tu estás? Terás tido filhos? Netos? Será que casaste? Será que foste ou és feliz? Como será que estás?
Tu bem sabes que eu fui imatura em ter cedido aos avanços da Terezinha que corria e se oferecia para mim como se fosse laranja madura, na beira da estrada. Eu não era apaixonado por ela, mas não resisti à minha sexualidade que estava à flor da pele e cedi aos encantos dela. Culpa minha, confesso, mas o que fazer? Eu era bobo e inexperiente. Não fiquei com ela, mas por causa dela te perdi para todo o sempre.
Eu casei, descasei algumas vezes. Tive cinco filhos e tenho oito netos. Hoje vivo um amor, que, para a nossa época seria proibido. Sou feliz, mas tenho uma saudade infantil e juvenil do teu riso e dos teus beijos. Escrevi um poema que está publicado no meu livro de poemas PERMITA-SE! Cujo título é OS BEIJOS QUE EU NÃO TE DEI, considero um de meus melhores poemas. Pensava em ti na hora da escrita.
Ria Fátima. Você nunca envelheceu para mim e se hoje não és mais aquela menina risonha e amorosa, deixe-me só com estas lembranças.
Querida Fátima, hoje eu moro no Rio Grande do Sul, litoral, uma delícia. Tenho amigos adoráveis como: Heloisa, Marlene, Silvania, Graça, Sandra, Bela, Egon, Lucimar, Regina e tantos outros, e até um amor que te surpreenderia pela contemporaneidade. Nossas praias litorâneas são lindas, apesar de extensas e ventosas, mas venha passear por aqui qualquer dia. Quiçá fazer uma aula de literatura, piqueniques na beira da lagoa ou até mesmo jogar cartas conosco.
Espero que não me surpreendas sendo uma velha senhora amarga, gorda e desdentada por ter um dia perdido um amor, que pensava não correspondido e te exilado da vida porque meus sonhos libidinosos e juvenis contigo tornar-se-iam pesadelos. Ainda és o meu conto de fadas num livro delicioso que me foi arrancado das mãos quando eu estava prestes a ler o final.
Onde será que vou te encontrar? Onde será que lerei a última página de nossa história inacabada?


Mário Feijó

P.S. exercício da Oficina Literária Mário Feijó, onde os alunos fariam uma carta a um amor do passado. Seja este amor fictício ou verdadeiro, convidando-o para visitar o autor na cidade onde hoje reside.


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