sábado, 3 de maio de 2014

quinta-feira, 1 de maio de 2014

MORRENDO DE SAUDADES



MORRENDO DE SAUDADES

As luzes da cidade acendem-se
Quando no horizonte
O alaranjado das nuvens –
Denominados arrebol –
Anunciam o anoitecer

E num misto de alegria e dor
Passo o final da tarde
Ouvindo os recados e gemidos do vento
Como se te anunciassem à minha espera

Queria abrir as janelas do décimo terceiro andar
E voar para a “nossa” casa
(penso que minh’alma ainda mora lá)
E recolher da lareira restos de cinzas da tua saudade

Não há mais quintal onde eu moro
A tua cachorra mora agora com crianças
Não tem mais o teu colo, nem o meu
E está sofrendo do coração (contaram-me)
Deve estar morrendo por saudades nossas

Mário Feijó
01.05.14

quarta-feira, 30 de abril de 2014

DEPENDENDO DA HORA



DEPENDENDO DA HORA

Tão frágil (aparentemente)
Feito a hortelã no quintal
Que quando macerada
Exala um odor agradável

Tão forte (aparentemente)
Quanto um diamante
Que tudo corta sem piedade
Mas que dependendo do toque
Fragmenta-se facilmente

Tão doce (espontaneamente)
Quanto é o mel de abelha
Que pode adoçar, alimentar ou
Ser usado como medicamento

Tão acre (esporadicamente)
Quanto o vinagre que tempera
Que já foi usado como antibiótico
Também equilibra o organismo

Sou assim dependendo do momento
Da situação e de quem comigo esteja
Se você se der eu me dou
Se me provocar eu me defendo
Mas se não se cuidar eu te envolvo com amor...

Mário Feijó
30.04.14

terça-feira, 29 de abril de 2014

O MENINO ENDIABRADO



O MENINO ENDIABRADO

Outro dia lhe chamaram assim: Menino Endiabrado. Ninguém queria saber suas razões. Ninguém queria saber por que ele não tinha casa e parecia não ter pai, mãe e irmãos. A razão é que seus pais e irmãos foram mortos, os demais parentes, ou aqueles que sobraram foram embora daquela pobreza, daquela terra sem lei.
O menino não tinha ninguém, então agredia aos outros e fazia mal a si mesmo. Não tinha ninguém para amar, restara-lhe o ódio: pela vida e pelos outros.
Lembrava ainda do último que se fora: seu irmão com apenas três anos que se protegia, junto dele no chão, das balas perdidas entre duas gangues. De repente seu corpo sofreu uma estremeção soltou um único gemido e calou-se para sempre. Havia apenas um buraco na cabeça.
El Louco, o menino endiabrado, tinha apenas onze anos. A pele era queimada de sol, suja pela poeira.
Morava numa vila esquecida por Deus e lembrada pelo Diabo que vinha sempre buscar mais um. Quando a calmaria batia no lugar o menino saia a esmo procurando algo para comer ou roubar. Colecionava coisas. Parara de colecionar mortos porque não lhe restara mais ninguém e tampouco alternativas.
O Menino Endiabrado assustava os moradores da vila, não porque queria, mas não tinha outra alternativa. Era sua única forma de chamar a atenção e de se defender: não tinha nada a perder. Era sua maneira de desafiar a morte. E se ela viesse estava pronto, não a temia. Ninguém iria por ele chorar. Lamentos? Não! Não haveriam: ele nem sabia por que vivia. E viver assim: pra quê? Pensava.
Até que um dia na vila entrou o patrão. Perdido, empoeirado, a cavalo querendo falar com seus pais. O garoto se divertia. O homem tornara-se igual a ele ali. Então jogava-lhe pedras e se escondia. Sabia que aquele homem era o dono da vila. Que nunca tinha vindo ali, mas o conhecia da vez que fora com seus pais à cidade e entrara na casa do patrão.
O homem nada entendia. Não sabia que o lugar tornara-se “terra-de-ninguém” e num momento de trégua quando o menino curioso se aproximou chamara-o e depois de saber de toda a sua história o convidara para ir com ele.
Passado algum tempo a vila se acalmara. Fora-lhe imposta ordem. A paz e o progresso voltaram: o menino cresceu. Agora era o dono de tudo. Seu novo pai o educara e lhe passara a responsabilidade de tudo. Ele começou a cuidar de sua gente. Descobrira um tio, uma tia e dois primos entre os moradores da vila. Começou a ajudá-los...
A vila prosperara e naquele lugar onde todos eram mestiços, a vida se modificara. O Menino Endiabrado se tornara um homem de bem e estava ajudando aos habitantes do lugar com educação e saúde.
As crianças não mais corriam descalças. Estavam na escola. As casas tinham lindos jardins floridos... começou até a ser chamada de Vila Formosa.  

Mário Feijó
29.04.14