quarta-feira, 30 de abril de 2014

DEPENDENDO DA HORA



DEPENDENDO DA HORA

Tão frágil (aparentemente)
Feito a hortelã no quintal
Que quando macerada
Exala um odor agradável

Tão forte (aparentemente)
Quanto um diamante
Que tudo corta sem piedade
Mas que dependendo do toque
Fragmenta-se facilmente

Tão doce (espontaneamente)
Quanto é o mel de abelha
Que pode adoçar, alimentar ou
Ser usado como medicamento

Tão acre (esporadicamente)
Quanto o vinagre que tempera
Que já foi usado como antibiótico
Também equilibra o organismo

Sou assim dependendo do momento
Da situação e de quem comigo esteja
Se você se der eu me dou
Se me provocar eu me defendo
Mas se não se cuidar eu te envolvo com amor...

Mário Feijó
30.04.14

terça-feira, 29 de abril de 2014

O MENINO ENDIABRADO



O MENINO ENDIABRADO

Outro dia lhe chamaram assim: Menino Endiabrado. Ninguém queria saber suas razões. Ninguém queria saber por que ele não tinha casa e parecia não ter pai, mãe e irmãos. A razão é que seus pais e irmãos foram mortos, os demais parentes, ou aqueles que sobraram foram embora daquela pobreza, daquela terra sem lei.
O menino não tinha ninguém, então agredia aos outros e fazia mal a si mesmo. Não tinha ninguém para amar, restara-lhe o ódio: pela vida e pelos outros.
Lembrava ainda do último que se fora: seu irmão com apenas três anos que se protegia, junto dele no chão, das balas perdidas entre duas gangues. De repente seu corpo sofreu uma estremeção soltou um único gemido e calou-se para sempre. Havia apenas um buraco na cabeça.
El Louco, o menino endiabrado, tinha apenas onze anos. A pele era queimada de sol, suja pela poeira.
Morava numa vila esquecida por Deus e lembrada pelo Diabo que vinha sempre buscar mais um. Quando a calmaria batia no lugar o menino saia a esmo procurando algo para comer ou roubar. Colecionava coisas. Parara de colecionar mortos porque não lhe restara mais ninguém e tampouco alternativas.
O Menino Endiabrado assustava os moradores da vila, não porque queria, mas não tinha outra alternativa. Era sua única forma de chamar a atenção e de se defender: não tinha nada a perder. Era sua maneira de desafiar a morte. E se ela viesse estava pronto, não a temia. Ninguém iria por ele chorar. Lamentos? Não! Não haveriam: ele nem sabia por que vivia. E viver assim: pra quê? Pensava.
Até que um dia na vila entrou o patrão. Perdido, empoeirado, a cavalo querendo falar com seus pais. O garoto se divertia. O homem tornara-se igual a ele ali. Então jogava-lhe pedras e se escondia. Sabia que aquele homem era o dono da vila. Que nunca tinha vindo ali, mas o conhecia da vez que fora com seus pais à cidade e entrara na casa do patrão.
O homem nada entendia. Não sabia que o lugar tornara-se “terra-de-ninguém” e num momento de trégua quando o menino curioso se aproximou chamara-o e depois de saber de toda a sua história o convidara para ir com ele.
Passado algum tempo a vila se acalmara. Fora-lhe imposta ordem. A paz e o progresso voltaram: o menino cresceu. Agora era o dono de tudo. Seu novo pai o educara e lhe passara a responsabilidade de tudo. Ele começou a cuidar de sua gente. Descobrira um tio, uma tia e dois primos entre os moradores da vila. Começou a ajudá-los...
A vila prosperara e naquele lugar onde todos eram mestiços, a vida se modificara. O Menino Endiabrado se tornara um homem de bem e estava ajudando aos habitantes do lugar com educação e saúde.
As crianças não mais corriam descalças. Estavam na escola. As casas tinham lindos jardins floridos... começou até a ser chamada de Vila Formosa.  

Mário Feijó
29.04.14      

segunda-feira, 28 de abril de 2014

MUNDOS DIFERENTES




MUNDOS DIFERENTES

É com frequência que eu sinto
A tua falta em minha vida
O teu vazio em minha cama

E quando ouço o sussurro dos ventos
É como se eu recebesse recados teus
E quando ouço o murmúrio do mar
Eu lembro dos rios teus

Ainda ontem estavas eu poema
Que eu li – não perdida, mas lembrada –
E é assim que tu ficaste em mim
Na saudade e nas lembranças

E os meus olhos se acendem
Como se fosses uma estrela cintilante
Iluminando meu caminho
Ligados apenas pelo pensamento...

Mário Feijó
28.04.14

domingo, 27 de abril de 2014

UM HOMEM, UM CACHORRO



UM HOMEM, UM CACHORRO

Apreciando o mar
Olhavam para o infinito:
Contemplativos, dispersos
Um homem e um cachorro

Era quase nada na paisagem
Mas havia ali uma poesia nas atitudes
E dentro dos seus olhares
Havia algo mais que a saudade

O mar deixava recados na areia
O cão eu não sabia o que pensava
Porém havia na atitude
O companheirismo fiel de um amigo

E o homem disperso viajava
Nas lágrimas que escorriam dos olhos
Levando-o aos momentos felizes
Que outrora vivera e que teimavam
Em manterem-se vivos na sua memória...

Mário Feijó
27.04.14

sábado, 26 de abril de 2014

PÁSSARO FERIDO





PÁSSARO FERIDO

Eu sou um pássaro solitário
Que voa sem destino
Sou levado por instintos
E por momentos de amor

E se tenho a alma ferida
As asas quebradas
Passo pela vida
Tentando não reclamar

Minha experiência telúrica
Faz-me pensar por horas
Que não sou carne frágil
Mas um anjo caído na terra

Há dentro de mim o desejo de voar
A solidão do elo perdido
Fazendo-me pensar que sou
Apenas um pássaro ferido...

Mário Feijó
26.04.14